A entrada em dezembro com os futuros de Nova York praticamente estáveis reflete a regra não escrita, mas poderosa, do “efeito de fim de ano”: em períodos de liquidez abundante e fechamento de posições, o mercado norte-americano tende a reduzir a volatilidade e a permitir realocações que beneficiam temporariamente os preços dos ativos. O fenômeno, documentado pelo Stock Trader’s Almanac, mostra que, desde 1950, o S&P 500 registra em média ganho superior a 1 % no último mês do calendário, o que transforma dezembro no terceiro mês mais favorável ao índice. Para a sociedade, o efeito colateral é indireto: a valorização das cotas de fundos de índice e dos planos de aposentadoria atrelados ao mercado eleva o patrimônio das famílias, com potencial impacto positivo sobre o consumo de bens duráveis e serviços nos primeiros meses do ano seguinte.

O contexto macroeconômico que sustenta esse otimismo de curto prazo combina inflação em desaceleração, mercado de trabalho ainda resiliente e expectativa de corte de juros. O índice de preços ao consumidor (IPC) dos EUA desacelerou para 3,2 % ao ano em outubro, bem abaixo da casa dos 9 % registrada no pico de junho de 2022. Com a taxa de desemprego estável em 3,9 % e a criação de 150 mil postos de trabalho no mês passado, o Federal Reserve (Fed) sinaliza que a política monetária pode entrar em modo neutro. Os contratos futuros de fundos federais (fed funds futures) precificam hoje 60 % de probabilidade de redução de 0,25 ponto percentual na faixa de juros já na reunião de dezembro, o que, se confirmado, levaria a taxa básica de 5,25 %–5,50 % para 5,00 %–5,25 %. A queda do custo do dinheiro, ainda que modesta, desconta-se imediatamente nos fluxos de caixa descontados das empresas e ajuda a explicar a alta de 3,7 % do S&P 500 na semana passada, somando-se ao ganho médio histórico de dezembro.

Apesar do viés positivo para o curto prazo, o ciclo recente não foi linear. Em novembro, o S&P 500 e o Dow Jones encerraram estáveis, enquanto o Nasdaq caiu 1,5 %, interrompendo sequência de sete meses consecutivos de ganhos. Parte da fraqueza veio do setor de tecnologia, especialmente de empresas de inteligência artificial cujos valuations se expandiram rapidamente: o Nasdaq chegou a recuar quase 8 % em relação a outubro, refletindo receio de que múltiplos altíssimos não sejam sustentáveis caso o Fed mantenha a taxa real de juros (juro nominal menos inflação) em torno de 2 % ao ano. O movimento ilustra como a política monetária afeta, por meio do afunilamento do prêmio de risco, o valor presente de fluxos de caixa projetados para décadas adiante. A correção parcial, no entanto, parece ter sido suficiente para recompor os spreads e atrair compradores institucionais que buscam posicionar-se antes do fechamento de livro, fenômeno que agora sustenta os ganhos de fim de ano.

Do ponto de vista prático, a combinação de juros em patamar historicamente alto, mas com viés de queda, e de crescimento do PIB acima de 2 % anual mantém o custo de capital elevado para empresas de capital intensivo, enquanto favorece setores mais defensivos, como utilidades e bens de consumo não cíclico. Para o investidor doméstico exposto a ETFs ligados ao índice Bovespa, a dinâmica norte-americana importa via efeito-portfólio: capitais globais tendem a migrar para mercados de risco quando o Fed sinaliza flexibilização, o que, ao depreciar o dólar, pode gerar entrada de dólares em economias emergentes. Ainda assim, o diferencial de juros real entre os EUA e o Brasil, que hoje gira em torno de 3 pontos percentuais, continua a atrair carry trade, limitando a perda de valor do dólar frente ao real e, por consequência, o impulso externo sobre as commodities cotadas em moeda norte-americana.

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